A
identificação do neurônio von Economo, já encontrado em seres humanos e em
alguns mamíferos, pode ajudar estudos sobre a evolução da autoconsciência e
sobre problemas neuropsiquiátricos como o autismo
Os
neurônios von Economo, descobertos agora em macacos com cauda, está relacionado
a processos de autoconsciência nos seres humanos (iStockphoto)
Um
grupo de cientistas do Instituto Max Planck, da Alemanha, descobriu um novo
tipo de neurônio em macacos com cauda - grupo que exclui os denominados Grandes
Primatas: gorilas, chimpanzés e orangotangos -, que antes se acreditava estar
presente apenas em humanos e em alguns mamíferos com comportamento social
complexo como grandes primatas, golfinhos, elefantes e baleias.
O
neurônio encontrado, chamado von Economo (da sigla em inglês, VEN), no ser
humano, está presente na ínsula e está relacionado a processos de
autoconsciência. Pacientes com autismo e outras doenças neuropsiquiátricas
apresentam alterações na quantidade de VEN.
Saiba
mais
NEURÔNIO
VON ECONOMO
O
neurônio von Economo (VEN) está presente quase que exclusivamente na ínsula
anterior e o córtex cingulado anterior. Até recentemente, acreditava-se que o
VEN só existia em humanos, grandes primatas e alguns mamíferos de cérebro
grande com comportamento social complexo, como baleias e elefantes. O VEN tem
um formato peculiar de fuso: é alongado e tem as extremidades mais estreitas
que o centro. Em autismo e em casos de demência, têm sua quantidade alterada.
ÍNSULA
Região
do cérebro relacionada à percepção, comportamento social e autoconsciência. A
parte anterior da ínsula, em particular, é onde os seres humanos sentem
conscientemente as emoções subjetivas como amor, ódio, ressentimento,
autoconfiança ou constrangimento. Em relação a esses sentimentos, a ínsula
anterior está envolvida em várias psicopatologias. Danos na ínsula levam à
apatia e à incapacidade de distinguir quais sentimentos nós ou a pessoa com
quem conversamos sente.
Os
resultados da pesquisa liderada por Henry Evrard, neuroanatomista do Instituto
Max Planck, foram publicados na última edição da revista Neuron.
Em
estudos anteriores, os cientistas não tinham encontrado sinais dessas células
em cérebros de macacos, exceto no grupo de grandes primatas, que são os
parentes mais próximos do homem. Evrard descobriu esse tipo de neurônio
diferenciado enquanto analisava um pedaço de cérebro de macaco para um outro
experimento. Os neurônios von Economo são longos e têm corpos mais largos do
que os demais.
De acordo
com os especialistas, a morfologia, o tamanho e a distribuição do VEN em
macacos sugerem que ele é, pelo menos, uma espécie primitiva do neurônio
similar encontrado no homem. Essa descoberta traz novas oportunidades para
examinar em detalhe as conexões e funções de uma célula e de uma região do
cérebro específica, que poderiam ser peças fundamentais para a autoconsciência
humana e para entender distúrbios mentais como autismo e algumas formas de
demência.
Os
cientistas explicam que, embora os macacos não consigam se reconhecer no
espelho, marca comportamental da autoconsciência, a descoberta fornece
evidências persuasivas de que macacos possuem, pelo menos, uma forma primitiva
de VEN humano.
“Isso
significa, ao contrário do que se pensava antes, que a concentração de VEN não
é uma exclusividade de hominídeos, mas também ocorrem em outras espécies de
primatas”, explica Henry Evrard.
Para
o pesquisador, a descoberta do VEN em macacos pode ajudar os cientistas a
entender o processo de evolução da autoconsciência em humanos e contribuir
também para o entendimento de incapacidades neuropsiquiátricas como autismo ou
a dependência de drogas ou de cigarro.
Tales
Alexandre Aversi Ferreira, neurobiologista especilista em primatas da
Universidade Federal de Goiás comenta a descoberta: "Com esse estudo, os
autores quebraram uma hipótese. A neurociência é muito demorada, ela anda
devagar. Essa descoberta é muito importante, mas ainda não revela muito."
Ferreira
comenta que, ainda que a descoberta isolada não traga muitos avanços, ela pode
ser um estimulante para novas pesquisas sobre o tema: "Possivelmente,
alguns neurocientistas começarão a gerar projetos para verificar a presença
destes intrigantes neurônios em outros primatas o que poderá indicar novas hipóteses,
agora mais concisas, sobre a evolução e funcionamento do sistema neural e sobre
as doenças associadas aos neurônios von Economo."
Opinião
do especialista
Tales
Alexandre Aversi Ferreira
Neurobiologista
especilista em primatas. Professor da Universidade Federal de Tocantins e
pesquisador colaborador da Universidade de Toyama - Japão
"Para
a construção do conhecimento, hipóteses são sugeridas antes de novas
descobertas para consolidarem teorias. Neste caso, a hipótese aceita pela
sociedade dos neurocientistas em relação aos neurônios von Economo, era que
eles existiam somente nos animais de grandes encéfalos, no entanto, eles não
foram procurados em todos os animais conhecidos, nem em todos os animais
próximos ao homem, ou seja, os primatas. Esses cientistas demonstraram que os
neurônios von Economo foram encontrados em um primata mais distante dos grandes
primatas e do homem, o famoso Rhesus (aquele que cedeu as iniciais para o fator
RH do sangue)."
"Aspectos
como o auto-reconhecimento e consciência foram associados aos neurônios von
Economo depois que foram encontrados numa parte escondida do encéfalo, que pode
ser vista quando se afasta os lados de uma grande abertura lateral chamada de sulco
lateral ou de Sylvius, o lobo da ínsula."
"Os
aspectos comportamentais relacionados a esses neurônios são intrigantes por
serem raramente encontrados na natureza e por indicarem uma pista a mais para
se conhecer o caminho evolutivo que levou o homem a ser a espécie mais
inteligente do planeta."
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